Ao decorrer das últimas décadas, Pedro Almodóvar se transformou de um diretor promissor a um dos maiores gênios da sétima arte a nível mundial. Desde suas comédias ácidas na década de 1980, seus primeiros clássicos e indicações ao Oscar nos anos 1990, a reafirmação do diretor como um ambicioso cineasta no início dos anos 2000 e os seus trabalhos mais recentes, como o polêmico “A Pele Que Habito” e o íntimo “Dor e Glória”. Todos comprovando que Almodóvar pode fazer, literalmente, qualquer coisa.
Em “Mães Paralelas”, é mentira dizer que ele está pisando em um terreno novo, inédito dentro de sua filmografia. A verdade é que, ao falar sobre maternidade, o diretor entregou alguns de seus filmes mais aclamados, como “Tudo Sobre a Minha Mãe”, que lhe deu o seu primeiro Oscar. Novamente ao lado de Penélope Cruz, ele opta por uma abordagem um pouco diferente e com objetivos mais amplos, sem perder sua essência e suas marcas, que fazem de suas obras peças únicas no cinema europeu.
Aqui, a trama começa com duas mulheres bem diferentes uma da outra: de um lado, a fotógrafa Janis (Cruz), uma mulher de meia-idade descobre que está grávida de seu primeiro filho; do outro, Ana (Milena Smit), uma adolescente que também fica grávida acidentalmente, mas ao contrário da outra, não está nada contente com sua gestação. Elas criam um laço enquanto esperam para dar à luz, e isso faz com que elas fiquem conectadas para sempre, ainda mais quando uma tragédia acontece meses depois.
Não apenas sendo um filme sobre a maternidade, “Mães Paralelas” cresce além das barreiras que aparenta ter e se torna um filme de cunho sociopolítico, sem nunca perder seu tom – mas, em alguns momentos, perdendo seu foco, já que a edição parece não saber o que é mais importante, principalmente no segundo ato. Enquanto Janis busca respostas sobre o passado de seus familiares durante a Espanha Franquista, o que aparentemente era uma obra sobre as loucuras da maternidade se torna um filme sobre a importância da verdade.
É impossível desenvolver este argumento sem cair na teia perigosa dos spoilers, mas após ver o filme fica claro o que foi dito aqui. É Almodóvar fugindo do óbvio mais uma vez e com poucos deslizes, criando em “Mães Paralelas” um dos filmes mais preciosos de sua carreira. E no centro de tudo, Penélope Cruz se conecta com essa personagem e compreende suas dores em uma performance honesta e natural. Mesmo sendo uma atriz muito prática, Cruz tem sequencias onde demonstra uma compreensão dos dilemas de Janis que são surpreendentes, e justificam sua indicação ao Oscar.
Em um filme escrito no auge da pandemia do Covid-19, quando todos estavam afastados da sociedade, Almodóvar entrega a nós de presente um dos filmes mais humanos e honestos de sua carreira. Transbordando qualidade no texto, no elenco (destaque também para a Milena Smit), a trilha sonora de Alberto Iglesias e a cinematografia de José Luis Alcaine, “Mães Paralelas” é Pedro Almodóvar fazendo aquilo que faz de melhor: sendo honesto consigo mesmo. E como é bom vê-lo fazer tudo isso.
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