Em 2012, o diretor Michael Haneke decidiu e explorar a velhice de forma singela e delicada em Amor; lá, ele acompanha um casal de idosos lidando com seus problemas diários e encarando a morte eminente, cada vez mais próxima e pronta para separá-los de uma vez por todas. Nove anos depois, o francês Florian Zeller decide seguir uma vertente diferente em Meu Pai: acompanhar a velhice de um senhor com Alzheimer, lutando para guardando suas memórias num lugar seguro de sua mente e contra si mesmo.
Meu Pai acompanha a rotina de Anthony (Anthony Hopkins) e Anne (Olivia Colman), pai e filha que vivem um momento conturbado de sua relação. Enquanto ele luta contra o Alzheimer, ela se apaixona e decide se mudar de país. Mas antes, precisa garantir que seu pai tenha a melhor assistência possível devido à sua debilitação, e eles acabam travando algumas discussões sobre o que é necessário ou não. (Confira o trailer aqui)
O grande mérito de Zeller aqui é narrar a trama com base na conturbada mente de seu protagonista. Com uma direção primorosa e uma montagem que lhe acompanha perfeitamente, ele deixa o espectador com a sensação de ter todos os detalhes em suas mãos, mas o roteiro brinca com a realidade e imaginação de forma impecável, fazendo com que tudo seja passível de dúvida. Assim, Zeller cria uma experiência imersiva fazendo com que o sentimento de sua estrela seja palpável por quem lhe assiste.
E, no centro disso, tudo, Anthony Hopkins entrega a melhor atuação de toda a sua carreira – e a melhor de 2020, por sinal. É visível como ele se sente confortável no papel, até mesmo nos momentos onde precisa aparentar desconforto. Assim como a performance de Frances McDormand em Nomadland, seu trabalho aqui vai além de bons diálogos: é uma atuação que beira o humano, o real, onde um simples olhar transbordando dúvida e agonia, com naturalidade e emoção, faz com que Hopkins sugue toda a energia do filme para ele.
Lutando para ter um pouco destaque ao lado da estrela, Olivia Colman entrega mais um trabalho dramático deslumbrante. Ganhadora do Oscar por A Favorita e indicada ao Emmy por The Crown, sua coadjuvante não serve apenas como um ponto de apoio dentro da narrativa sobre Anthony, mas abre espaço para que sua própria história seja contada. Até que ponto as necessidades daqueles que amamos se torna um fardo maior que os nossos desejos? Meu Pai não tem o objetivo de lhe responder esta pergunta, mas de plantar a dúvida em sua mente.
No fim das contas, Meu Pai é um filme sobre ser humano. Sobre o ato de envelhecer e padecer. Sobre a fragilidade humana, que nos deixa a mercê de nossa própria mente. Florian Zeller joga seu expectador dentro de um apartamento que transmite claustrofobia em certos momentos (mérito da cinematografia de Ben Smithard e da direção de arte de Amanda Dazely), onde uma simples cena onde Anne abre uma janela para respirar ar livre faz com que respiremos fundo junto a ela. Poderoso, delicado e emocionante, é um filme que martela na cabeça por muito, muito tempo.